sexta-feira, 17 de agosto de 2012

Os candongueiros


Estou na correria com o tratamento da malária – graças a Deus está tudo certo comigo, só fazendo os últimos exames e acompanhamento; um susto que já passou. Ontem acordei 5h30 da manhã e fui até o Hospital da Divina Providência, que é longe de casa e para chegar lá precisei pegar duas lotações. Novamente eu era a única estrangeira na fila - que aqui, como em Portugal, chama-se bicha - a espera do coletivo.

Bem, tenho utilizado muito o “sistema alternativo de transporte público” daqui - uma espécie de vân, perua, combi, como chamamos no Brasil, onde cabem, dignamente, 10 pessoas, mas sempre levam mais de 15. Enfim, veículos que têm uma pintura padrão, azul e branca. Há pouquíssimos ônibus estilo circular e são lotadíssimos. Os condutores são chamados de candongueiros.

Os gandongueiros trabalham mais ou menos da forma que os motoristas de peruas em São Paulo, especialmente na zona leste. São muitas vans, do lado de fora, no ponto,  há sempre um cobrador que chama os passageiros dizendo o destino. Os preços variam entre 100 e 200 Kwanzas. Quando o carro está muito lotado eles dizem “emagrece ai Mamá”, ou seja: aperta aí, dá um jeito.

Geralmente os candongueiros são bem conversadores. São exímios motoristas e parece que vão bater o tempo todo, no entanto, não batem. A impudência no trânsito é assustadora; no começo eu morria de medo, agora já estou mais acostumada. Muitos trabalham algumas horas, fazem o seu montante e voltam para casa. Outros trabalham em períodos mais longos. A maioria deles está ilegal, então frequentemente são abordados por policiais. Muitas vezes acertam ali mesmo, dão lá seu jeito. Eu só observo e finjo que não percebo as negociatas. Nos primeiros dias esses fatos me impressionavam mais, agora já nem tanto. Não que eu concorde, mas sempre comparo o jeitinho angolano com o jeitinho brasileiro.

Álcool e trânsito também são muito comumente associados em Angola. Tem vezes que alguns motoristas e cobradores já estão um pouco alterados, principalmente nas sextas-feiras à tardinha e nos sábados. Bebem cerveja ou wisque em saquinho ali mesmo. Já houve casos de eu entrar em uma vã e encontrar vários passageiros com os ânimos alterados. Observo, acho graça, embora às vezes tenha de esconder o riso. Às vezes recebo propostas de casamento ali mesmo; saias justíssimas.

Nunca vi mulher candongueira, só zungueira, creio que seja da própria cultura, mas vou pesquisar se existe alguma. Se eu encontrar lhes conto!





quinta-feira, 16 de agosto de 2012

Dia 31 de agosto, eleições presidenciais em Angola


As estatísticas não são muito confiáveis, pois não há recenseamento recente em Angola, mas estima-se que cerca de 9 milhões de pessoas irão às urnas para eleger deputados à Assembléia Nacional e um presidente da República neste dia 31 de agosto. Desde o início deste mês as aulas foram suspensas para organizar o processo eleitoral.

São nove partidos e coligações MPLA (Movimento Popular de Libertação de Angola),  Unita, de Isaías Samakuva, o Partido de Renovação Social (PRS), de Kuangana, a FNLA, de Lucas Ngonda, a Nova Democracia, de Quintino Moreira. Convergência Ampla de Salvação de Angola, de Chivukuvuku. 

Em quase 37 anos de independência, este é o terceiro processo eleitoral em Angola. Muitas mobilizações em forma de palestra tem ocorrido nestes últimos meses para que a população se conscientize da importância do voto.

Segundo informações oficiais,  Angola que é muito rica em petróleo e diamantes, tem crescido – de 2002 a 2008 a uma média anual de 17% do PIB.  A previsão é de que cresça 8,9% no ano de 2012.

Eleições em Angola - de olho no futuro o jovem país vai às urnas


quarta-feira, 15 de agosto de 2012

Curiosidades sobre Angola


Meus amigos brasileiros me fazem uma série de perguntas sobre como tenho vivido aqui em Angola. Bem natural, pois no Brasil temos pouquíssimo conhecimento sobre o continente africano. Bem, ainda estou descobrindo Angola, mas já tenho algumas respostas, então resolvi responder publicamente. Talvez seja interessante para outras pessoas, além do meu círculo de conhecidos. 

Onde eu morro é uma casa estilo português, um sobradinho, tem dois andares e vizinhos por todos os lados. Tenho um quarto só  para mim. É uma casa de propriedade das irmãs. Moro com a Irma Neiva. Ela trabalha o dia todo na Universidade Católica. Não é um bairro pobre, mas a rua frequentemente tem um lamaçal por conta de que os próprio moradores jogam água na rua. Ando de candongueiro (vã), não tenho carro aqui.

Como você se veste? Me visto normalmente, mas tenho me habituado a usar saias longas, ninguém me obrigou, mas achei mais coerente com a realidade que vivo.

Tem água pra você tomar banho em casa? Tem água em casa, mas falta frequentemente, aqui em casa temos dois reservatórios. Então é mais difícil ficar sem, mas, eventualmente acontece.

O que você come? De tudo, compramos as comidas no mercado e fazemos em casa. As comidas regionais são muito diferentes, exóticas. Dedicarei um post para falar de comidas.

Como é o custo de vida em Luanda? É muito caro, comida, principalmente, é muito cara. 

Você sai? Tenho saído pouco. Estou me adaptando, conhecendo melhor antes de me aventurar por aí (risos).

Angola é muito diferente do Brasil? Muito, em tudo, mas há semelhanças, principalmente nas questões de políticas públicas.

Você tem internet em casa? Sim, mas nem sempre funciona.

Para saber porque estou em Luanda, clique aqui.


Malária


Mau acordei e percebi que estava fraca, com dor nos olhos, na nuca e com muita fraqueza.
Aguniada, levantei e já dei de cara com lindos cartazes espalhados pela sala, com lindas mensagens desejando felicidades.Era meu aniversário!
Li, as mesagens e me emocionei. Desci as escadas e ao chegar na cozinha eis que vi um lindo bolo e a mesa toda arrumada.
A alegria tomou conta de mim, mas assim que sentei e comecei a tomar meu café, me senti tonta e sem apetite.
Resmunguei um pouco, não é possível justo hoje, bem hoje!
Indaguei, por quê?
Aguentei aquele dia, no outro fiz exame e deu positivo. Estava com malária.

Meu tratamento com medicamentos vai até sexta-feira, 17 de agosto. Apesar do susto estou bem, creio que vou passar por esta. Enfim, é uma experiência e tanto.

A Malária é uma doença transmitida por mosquitos que, segundo dados da Organização Mundial de Saúde (OMS), afeta mais de 500 milhões e mata mais de 3 milhões de pessoas por ano no mundo.

É a principal causa de mortes em Angola, seguida dos acidentes automobilísticos.

Veja mais informações aqui


terça-feira, 14 de agosto de 2012

Pequeno glossário de falas angolanas


Apesar de falarmos português, a pronúncia de muitas palavras aqui em Angola é bem diferente da forma que falamos no Brasil. Claro, além do sotaque aportuguesado,os dialetos locais também tornam a fala daqui bem única.

É preciso acostumar os ouvidos e prestar muita atenção para entender a maior parte do que os angolanos falam.

Resolvi listar algumas falas interessantes para compartilhar com vocês. Veja:

- Para desligar, ou sair de uma ligação, a pessoas falam
‘com licença’, não dizem tchau, beijos até como no Brasil.

- Jogar algo fora: deitar fora. “Deitar na lixeira”: jogar no lixo.

- Não entendi: não percebo.

- Estou te ligando: estou a telefonar.

- Aconteceu um problema: houve uma situação.

- Estás entendendo?: ta a ver?

- Esta tudo bem: tudo a andar

- Tudo bem?  A resposta é “tudo normal”, sempre!

- Dar dinheiro em troca de algo: dar uma gasosa.

- Tomar suco: tomar sumo

- Ir ao banheiro: ir à casa de banho.

Vou tentar traduzir esse pequeno texto para vocês entenderem do
que estou falando: “estou a traduzir um trecho para vós perceber o que estou a falar”.

- Mulheres: mamás.

- Homens: pai ou papa na linguagem do dia a dia.

- Criança: miúdo.

- Moto: Mota.

- Sempre que falamos bom dia, boa tarde ou boa noite as pessoas respondem: obrigada. Para ir dormir, dizem “feliz noite”.

- Viver sozinho: viver a um.

- Administrador: prefeito.

- Motoristas de vans: condogueiros.

- Vendedora ambulante: mulher zungueira.

- Tomar café: bichar.

- Tomar vacina (vacinar): apanhar vacina.

- Carros: viaturas.

- Café da manha: pequeno almoço.

quarta-feira, 8 de agosto de 2012

As aldeias


Ontem, juntamente com a irma Enedir, visitei vários lugares nos arredores da capital. Fomos a algumas aldeias muito pobres. 

Chamaram-me a atenção a quantidade de cabritos na beira da estrada e as queimadas ao longo do caminho. Também percebi muitas praças onde centenas de mamãs oferecem seus produtos. Assim que o ônibus passa, elas correm até as janelas gritando suas ladainhas vendedoras. São inúmeros produtos locais que elas carregam dentro de bacias e sacolas no alto da cabeça; saem correndo e fazendo alarido para tentar vender.

Há muitas aldeias no percurso, com pequenas casas, feitas rusticamente. Em muitas localidades ainda não há escolas, água e energia. Há lugares onde se vê muitas plantações, e há trechos desérticos. A limpeza das terras é feita através de queimadas e isso se estende a um grande território.

Vi mulheres com semblantes cansados e crianças com doces olhares, expondo seus dentes branquíssimos; convidando a alma da gente a também sorrir em meio a tanto sofrimento.

Aldeia angolana

terça-feira, 7 de agosto de 2012

Hoje é meu aniversário


Hoje é meu aniversário. Fiz 29 anos. Meu primeiro aniversário em terras africanas. Ganhei um lindo bolo e à tarde vieram me visitar as irmãs Enedir, Carmelita, as amigas, Rosário, Mariana e Alfonsina. Elas comeram o bolo cantaram parabéns, mas eu infelizmente não pude comer, pois estava indisposta. Penso estar com malária, mas não tenho certeza; amanha farei o exame.

A irmã Neiva, com quem moro, desenhou lindos cartazes e panfletos com mensagens de motivação. Pela manhã quando acordei já estava preparada uma mesa linda, toda decorada. Fiquei muito feliz, embora cansada e com as pernas trêmulas.

Embora me sinta muito mal hoje, sei que há muitas pessoas me desejando felicidades. Quero entrar na internet mais tarde para agradecer meus amigos, todos muito gentis e carinhosos. Vou postar essas palavras que agora rabisco em meu caderno.

Sinto falta da minha família e meus amigos, mas estou crescendo a cada dia.
Bem, sou grata a Deus por essa oportunidade e mesmo estando um pouco doente, sei que não poderia ter presente  melhor do que a amizade de todos vocês.

Obrigada do fundo do meu coração pelo carinho.
Beijos

o melhor presente é o sorriso de uma criança. 

segunda-feira, 6 de agosto de 2012

Mama Muxima


Saímos neste domingo dia 05 de agosto às 3h30 horas do Cazenga e fomos até o Santuário de Mama Muxima. 

Localizada a 130 quilômetros de Luanda e a 90 de Calumbo, na margem esquerda do rio Kwanza, conta-se que a Igreja da Nossa Senhora da Muxima foi fundada em 1599. Classificada como “monumento provincial” em 12 de Janeiro de 1924, quando Angola era colônia de Portugal.

Havia milhares de pessoas, muitas delas haviam pernoitado lá.  A missa celebrada por Dom Filomeno Vieira Dias, Bispo da diocese de Cabinda, foi emocionante. 

Como em Santa Catarina que tem o santuário de Madre Paulina e em São Paulo o da Aparecida do Norte, aqui em Angola é o Santuário da Mama Muxima, que significa mamã do coração. É muito importante para a comunidade católica. 

Com tempo irei falar mais sobre a lenda de Mama Muxima.

Veja mais informações aqui

milhares de angolanos no Santuário de Mama Muxima


domingo, 5 de agosto de 2012

Unicef comemora um ano sem poliomielite em Angola


No último sábado, dia 04 de agosto, o Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF) realizou  em Luanda um evento em comemoração de um ano sem o registro de poliomielite em Angola. Foram realizadas palestras e formação de lideranças. A entidade contou com a parceria da Irmãs Catequistas Franciscanas, a Pastoral da Criança da Diocese de Viana e suas líderes comunitárias, além de profissionais da Cruz Vermelha  em  Angola.

 Foi a produzido um filme para mostrar as ações para combater a pólio e o trabalhos dos educadores e formadores sociais que contribuem para que esta doença seja extinta. Neste filme poderemos  ver um pouco de como as líderes da pastoral da criança trabalham para ajudar a conscientizar a comunidade.
Parte da filmagem foi realizada no Jango das Imãs Franciscanas Município do Cazenga, sob a coordenação da irmã catequista franciscana Enedir. 

Estiveram presentes neste encontro, além das líderes da Pastoral da Criança, irmã Enedir, assistente social responsável pelo projeto, a equipe da UNICEF, voluntários da Cruz Vermelha, estudantes da Universidade Católica e estagiárias de assistência social.

A conscientiçao da populacao é muito importante para que a doença possa ser combatida, pois é preciso 3 anos consecutivos sem a doença para só então o País estar livre dela.

Unicef grava documentário durante o evento

sexta-feira, 3 de agosto de 2012

A viagem de volta


Saí de Kuito no dia 02 de agosto às 6h15 da manhã. A viagem de volta foi tão cansativa quanto a de vinda. As pessoas estavam impacientes e reclamando. A música era muito alta e estávamos saindo com uma hora de atraso. A maioria dormiu ali no ponto do ônibus, ou acordou por volta das duas da madrugada para garanti lugar.

As irmãs Graça e Adilma que moram e trabalham no Kuito me fizeram companhia até a partida. Percebi que o centro da cidade está bonito, mais a periferia é uma coisa de outro mundo. Conheci pessoas muito boas em Kuito e pretendo voltar várias vezes.

Ouvi dizer que este era o melhor ônibus. Do meu lado não sentou ninguém por um bom trecho. Novamente, eu era a única estrangeira na lotação. Passamos pelo Thissiondo, um bairro pobre que tive a oportunidade de conhecer. Neste bairro a Irmã Adilma trabalha  e a Irmã Carmelita deixou um legado quando por lá passou. A escola está sendo construída com ajuda da população. Um esforço coletivo, lindo de se viver!
Bem mais experiente, hoje tentei pegar um bom lugar, ao lado da janela. Fui uma das primeiras a entrar, mas essas janelas só podem abrir um pouquinho. 

O motorista parecia bem tranquilo, estava torcendo para que continuasse assim, mas minha intuição na falha. Tinha uma rapaz que desde que saímos falava muito alto e queria chamar a atenção o tempo todo. As estradas são perigosas, com apenas duas vias bem estreitas. As pessoas aqui andam muito rapidamente e eu pedia a Deus que me guiasse. Em Angola é muito comum acidentes automobilísticos. Estava com sono e dor de cabeça, e para variar atrás de mim tinha um casal de idosos que não parava de falar, e bem alto na língua local, que eu não entendia nada. Perturbador.

Ainda tinha o moço que não parava de falar, tirou o motorista do sério e eles discutiram.  O condutor então resolveu andar devagar e a viagem durou 4 horas a mais que o previsto, foi muito cansativa, conflituosa e chegou uma hora que nem a beleza da paisagem me empolgava.

Estava triste por ter apagado mais de 500 fotos que tirei da cidade, mas, tudo tem uma razão de ser e ficarão nas lembranças as coisas que vi e as pessoas lindas que conheci. A companhia da irmã Adilma, o entusiasmo do Padre Bernardo, a missa celebrada no dialeto Humbundo, a inteligência e simpatia da Iris e a receptividade  do povo...

Enfim, estou descobrindo muita coisa. Ah, há sim “galinhas angolistas” em Angola. Em Kuito são chamadas de Capote. Contaram-me também que estes ônibus aqui são sucatas brasileiras que foram reformadas e trazidas para a África. 

feira à beira da estrada: os passageiros dos ônibus são os clientes


quinta-feira, 2 de agosto de 2012

À medida que avançam os dias


Naturalmente que alguns costumes angolanos me são estranhos. O óbito é uma destas questões. O ritual para velar os mortos é bem diferente do nosso. Na rua onde fica a casa que estive em Kuito presenciei dois velórios. Um rapaz de 17 anos que morreu de acidente e uma jovem mãe que teve complicações pós parto. As pessoas ficam dias e noites na casa do falecido; há festas e comidas. 

Outro assunto que me chama a atenção é a poligamia; por aqui é uma prática comum (um homem casado com duas ou mais mulheres) e torna-se um problema grave, principalmente pela disseminação de doenças e controle de natalidade, além, é claro, das desavenças familiares.

Conheci uma jovem chamada Iris, mesmo nome da minha mãe. Uma moça amável, inteligente e linda. Nasceu no Kuito, é filha de um português e uma angolana. Mas, como ela mesma diz, é fruto de uma traição. Seu pai tem mais dez filhos e sua mãe tem seis, ambos não moram juntos, cada qual tem uma família. Enfim, ela não é totalmente negra e por isso sofre preconceito. É discriminada por muitos angolanos, que rotulam os variados tons de pele, têm preconceito com os brancos e com os chineses.

Iris é uma jovem que se destaca das demais, apesar de ter sido abandonada pela mãe e criada um pouco pela avó, um pouco pelo pai, tem uma consciência brilhante. Voltou recentemente da Republica Tcheca, onde fez um intercâmbio de seis meses e está constantemente em busca de algo que lhe torne uma pessoa melhor. Levou-me para conhecer um pouco mais da cidade, e me deixou a par de uma série de situações que sozinha e neste curto espaço de tempo eu não teria capacidade de conhecer. 

Bem, a medida que avançam meus dias nesta jornada, vou me inteirando da cultura de Angola. Sinto-me como uma esponja, quero só absorver. 

quarta-feira, 1 de agosto de 2012

Pela paz


Ontem fui conhecer um pouco dos bairros periféricos daqui de Kuito. Vi muitas coisas boas; pessoas batalhando pela dignidade, criando várias formas para sobreviver, levando a vida sem medo. Mas há o contraste da pobreza, da vida indigna, dos traços que a guerra teima em manter presente em muitos lares e mentes. 

Vi muitas pessoas bebendo algo em um saquinho que custa em torno de 20 kwanzas. Descobri que é um tipo de "wisque" chinês. Bebem como se fosse água. Por falar em água, ficamos dois dias sem - a falta dela é um problema comum e habitual em toda a Angola. O excesso de bebida alcoólica também é um problema nacional; paradoxalmente, muitas vezes é mais barata que a água escassa. 

O povo faz o que pode, mas o ritmo da Angola é lento, as coisas são demoradas e, muitas vezes, uma das formas de tentar fugir da realidade cruel é beber. A tal da cuca (cerveja) é encontrada em todo lugar, tão fácil quanto o saquinho de "wisque".

Há bairros que nem têm estradas, somente picadas. As escolas são precárias, sem carteiras, sem material e sem professores; nas que têm docentes, eles não estão preparados.

Também percebi que o custo de vida daqui é bem mais barato que em Luanda. Enquanto a passagem de ônibus lá custa de 100 a 200 kanzas, aqui sai por 50 em média.

Estamos em período de eleições. Fala-se em “votar pela paz”; não sei qual o sentido exato dessa paz que mencionam, pois já faz mais de dez anos que não há guerra civil. No meu ver, votar deve ser pela justiça, pela igualdade social e pela melhoria nas políticas públicas e isso se refletirá em paz. Penso que os políticos preferem jogar com os traumas da população. 

Nenhuma novidade para quem veio do Brasil, não é? Mais do mesmo, só que do outro lado do Atlântico.

Esperança - jovens trabalham na construção de uma nova escola


Mil e uma


Estou aqui do outro do Atlântico lembrando de um comercial de esponja de aço; aquele das mil e uma utilidades. Bem, dei-me conta de que o pano – isso mesmo, um pedaço de tecido grande - aqui em Angola merece este slogan. Explico-me.

Nesta viagem a Kuito (que expliquei no post de segunda-feira) senti muita falta de um pano. O ônibus em que viajei não tinha banheiro e as pessoas precisavam parar e fazer suas necessidades no caminho, nos matos... A certa altura paramos em uma praça onde acontece uma espécie de feira, com pessoas comprando e vendendo de tudo um pouco. Eu precisava ir ao banheiro, pois como fazia calor tomei muita água. Para minha surpresa não tinha nenhum toalete. Deparei-me com uma cena inusitada: as mulheres ficam uma em frente à outra com o pano das mil e uma utilidades; enquanto uma faz o seu xixi outra faz “cortininha”. Eu no consegui. Não tinha um pano. Quando cheguei ao meu destino estava cega de vontade de correr para o banheiro, e assim foi.

Bem, de hoje em diante levo o meu pano por onde for. Para a volta, já providenciei dois, embora eu espere não precisar deles. Para finalizar com um lugar comum: melhor prevenir do que remediar.

quem tem pano tem tudo!