quarta-feira, 25 de julho de 2012

Mulheres Zungueiras


mulheres zungueiras

Hoje resolvi falar para vocês sobre as mulheres angolanas. Com suas vestes coloridas e seus panos, que significam muito mais do que um simples pedaço de tecido, pois os usam como toalhas, como bolsas, para se vestir, para cobrir os filhos, carregá-los etc., elas são um espetáculo à parte

Senhoras de todas as idades e feições caminham pelas ruas e praças, com bacias, balaios, sextos, sacolas cheias de mercadorias. Levam pão, peixes, frutas, legumes, sanduiches, bebidas, livros etc. Envolto nos tecidos coloridos tem de tudo um pouco. Parecem verdadeiras equilibristas a caminhar, superando os desafios da gravidade, levando um utensílio cheio de mercadoria no alto da cabeça, um filho nas coisas e às vezes outro no braço; às vezes tudo isso e outro filho na barriga.

Sem contar as que ficam sentadas nas praças. Ali esticam o pano, uma do lado da outra e passam o dia inteiro vendendo de tudo: sapatos, roupas, utensílios, frutas, verduras, carnes, ovos, mercadorias novas, velhas, mais ou menos , usadas e por ai afora.

Essas são as Mulheres Zungueiras, que no Brasil chamamos simplesmente de vendedoras ambulantes. Batalhadoras, guerreiras, com as mãos calejadas, as costas arcadas e na sua maioria com vários “pares de filhos”, como dizem por aqui. Além da vida dura, de acordar cedo, atravessar a cidade com cargas enormes na cabeça e o filho caçula amarrado ás costas elas precisam fugir constantemente. Largar tudo e correr! Não há uma relação amigável entre elas e a fiscalização. É o que contam. Dizem que há cenas que ninguém deveria presenciar, mas quando se presencia não há o que fazer, o melhor é calar. E eu prefiro não questionar, não agora.

Mas de onde surgem tantas Zungueiras? Elas vêm de várias províncias. Vieram em tempos de guerra em busca de segurança na capital, pois aqui era um dos lugares considerados mais seguros. Tiveram que aprender a se virar e trabalham de sol a sol em busca de seus sonhos, de uma vida mais justa.

Depois de um dia exausto, essas guerreiras ainda vão para as aulas de alfabetização, para buscar um pouco de conhecimento. E assim, sentem-se valorizadas e vislumbram no caminho uma luz de dignidade. O que não encontram no dia a dia nas ruas, e muitas nem em suas próprias casas. Aquelas que não podem estudar à noite acordam de madrugada, vão para a aula bem cedo e depois  partem para suas andanças. E lá se vai mais uma, duas, três Zungueiras batalhar pelo pão de cada dia.

A palavra zungueira vem de zunga, que é originária da língua Kimbundo e quer dizer andarilha, andante.

Lembro-me que no primeiro dia em Luanda acordei com esse grito: “êeeee”. Intrigada com isso pensei: que canto mais estranho! Não sabia o que era, não compreendia as palavras. Saí cambaleando da cama, ainda sonolenta e corri até a janela. Eis que vi várias mulheres levando na cabeça bacias cheias de peixes. Depois descobri que o que elas berravam era é “Carapauêee”. Estavam vendendo peixes frescos, que em uma das línguas locais quer dizer Carapau. O Êee é só um complemento, um vício de linguagem para efetuar as vendas.

Já não tenho mais idade para me transformar em angolana, nem Zungueira tradicional. A exemplo dessas mulheres guerreiras, quiçá eu me torne uma Zungueira de ideias; dessas ambulantes que levam esperança e conhecimento a todos que tiverem interesse.

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